quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

Querido C.,

Escrevo-te, pelo simples motivo, de sentir saudades dos tempos em que se escreviam cartas.
Sinto a falta dos tempos em que não existiam e-mails, sms, nem sequer o corrector ortográfico. Esses tempos em que não se poupavam palavras, nem caracteres, não se utilizavam abreviaturas, nem letras desconhecidas do alfabeto português e tinha-se cuidado com a caligrafia. Não existiam relatórios ou recibos de entrega e não existiam pressas em receber uma resposta. O correio tardava, ainda não era azul e o carteiro tocava sempre duas vezes.
Tenho saudades das folhas coloridas e perfumadas, compradas na papelaria do Sr. Salvador, enquanto os meus pais preenchiam o totoloto. Folhas que enchíamos de coraçõezinhos e outros desenhos, só para dar força às nossas palavras.
Gostava desses tempos em que se podia dizer "gosto de ti" e esse era, literalmente, o seu significado. Não se classificava esse "gostar", não se dividia entre paixão ou amor, nem se mediam intensidades ou se calculavam objectivos. Gostava-se e pronto, só porque sim. Desconhecíamos expressões como "estou interessada", "isto é só uma curte" ou "uma amizade colorida".
Era giro ir para trás do pavilhão, que acreditávamos ser o grande esconderijo, onde, de forma inocente, jogávamos ao bate-pé, só pela esperança de que Aquele rapaz nos pedisse um 2 ou um 3.
Antigamente, ninguém perguntava se tínhamos Facebook ou Messenger, mas sim qual era a nossa turma, a nossa sala ou o nosso horário. Não dizíamos um "depois ligo-te" ou "mando-te uma mensagem", mas sim um "logo vemo-nos". E víamos! No intervalo das aulas, no café ao lado da escola ou no jardim perto de casa. E quando o interesse era mesmo grande, esperavam-nos à porta da sala, ao dar o toque de saída das aulas.
Noutras alturas, não existiam telemóveis e dar um número de telefone era já um grande compromisso. Porque era o de casa, não identificava o número e podiam ser os nossos pais a atender.
Não se ouviam expressões amarguradas como "os homens (ou as mulheres) são todos iguais", nem se faziam comparações, porque tínhamos ainda consciência que uma pessoa é uma grande descoberta.
Noutros tempos, não existiam, também, mensagens fora de horas e tudo podia esperar até amanhã. Não havia excesso de trabalho, nem falta de tempo. Não havia pressa de chegar, nem pressa de partir, porque o mundo estava ainda aos nossos pés.
Tenho saudades desses tempos, em que tudo era simples, fácil, espontâneo e autentico.

Beijinhos,
Nuance

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